domingo, 16 de janeiro de 2011

Fluxo do Cipó da Volta

Carmen Sílvia Musa Lício

Estava em meu ambiente de trabalho quando, após as múltiplas tarefas que me são imputadas como funções da minha ossada, ou melhor, alçada, fui verificar se havia algo mais na minha pasta de enfermeira para providenciar... Separei por setores (vigilância epidemiológica, relatórios diversos, pedidos de Oxigênio, visitas domiciliares...) e coloquei nos devidos lugares para providenciar.

De repente, não mais que de repente, vi no meio da papelada um processo de Ouvidoria (em outras palavras, reclamação) que exigia resposta imediata!!! Resolvi ler o conteúdo da reclamação, já que havia tanta urgência e, qual não foi minha surpresa ao saber que a reclamante dizia não ter sido informada, quando da remoção de seu neto de 4 anos até o PS mais próximo, que a ambulância não poderia esperar para traze-la de volta até o “recôndito do seu lar”!!! Reclamava ainda que, como tinha vindo às pressas à nossa UBS trazer o neto para um atendimento de urgência não teve tempo para se lembrar de trazer documentos e dinheiro para a passagem de volta, tendo que retornar ao seu lar “como indigente”. Não é "meigo"?

Só me faltava esta!!! Além de providenciar o atendimento médico com rapidez e conseguir uma ambulância com muita dificuldade, pois ambulância em nosso sistema de saúde é uma raridade, agora temos que nos preocupar em saber se a “fulana” está devidamente “documentada”, “endinheirada”, enfim, preparada para ser atendida no PS, sem documentos dela e do menor em questão, e sem condições para o seu retorno e até para tomar um lanche, caso necessário.

Ah! Muito importante! Também devemos saber se há assistente social no PS, e, de preferência, se a mesma tem recursos para fornecer a passagem de volta para a avó e a criança...

Ela se esqueceu, sim!!!

Esqueceu-se de agradecer a nossa presteza em socorrer seu neto, apesar de não haver trazido documento algum, nem dela nem do infante; de agradecer por providenciarmos com presteza uma ambulância para a sua remoção, apesar de não termos nenhuma comprovação de que ela é quem diz ser, enfim, sem documentos que os identificasse; se esqueceu ainda de agradecer ao pessoal do PS, que atendeu e cuidou da criança sem exigir qualquer documento para que tal acontecesse.

Só não se esqueceu de reclamar!!!

Agora, quanto a ter tido que voltar “como uma indigente”, me diga, por favor, o que é uma pessoa que é atropelada na rua sem documentos? Uma indigente! Caso alguém morra e ninguém reclame o seu corpo, não será enterrada como indigente??? Pois é...

Agora, ao responder esta queixa de ouvidoria, cheguei à conclusão de que talvez também seja minha função escrever um “Fluxo do Cipó da Volta”. Dá para acreditar???

2 comentários:

  1. Daladier:

    Que honra!!! rsss

    Que bom que você veio até aqui e mais ainda que me adicionou...

    Espero que goste das minhas crônicas!

    abçs

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