quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Envelhecer é uma Arte

Carmen Sílvia Musa Lício

Quando somos crianças, olhamos os mais velhos com um misto de dó e compaixão. Aliás, nesta fase, pessoas de 20 a 30 anos são consideradas por nós, ainda crianças, muiiito velhas.

É interessante como tudo depende da perspectiva que vemos. Soube, há alguns anos, de uma senhora que, ao saber que o prefeito eleito da cidade de Ubatuba tinha 60 anos, disse:-“Rapaz de futuro...”. Pois é, a “dita cuja” tinha “prá mais de 90”!!!

Após alguns anos de vida, lá pelos 15, consideramos nossos pais, no mínimo, uns “babacas”, que pensam que sabem tudo, mas não sabem nada, nem nos educar, nem gerenciar o seu dinheiro, nada...
Pois é, o tempo continua passando e, lá pelos 25-30, já casados ou “arrumados” (ou algo do “gênero”), percebemos que os coroas “até que não eram tão ruins”, que “até tentavam fazer alguma coisa” diante da vida e conosco. Nesta época ainda estamos “em pleno vigor” e “a todo vapor”. Temos saúde, amigos, condições de subsistência, ânimo, planos, muitos planos para o futuro.
Aliás, a juventude é uma sucessão de feitos e acontecimentos; podemos tudo! Seremos felizes, escolheremos a melhor companhia para passarmos o “resto das nossas vidas”, teremos filhos educados, obedientes, seremos profissionais bem sucedidos, teremos uma casa “de verdade” num “local digno”, viajaremos por “todo o mundo”, e mais isso e mais aquilo...

Mas o tempo teima em passar, e, lá pelos 40, nos vemos ainda correndo atrás ou esperando as coisas acontecerem. E as coisas nem sempre acontecem. Os filhos, adolescentes, nos questionam da mesma forma (ou mais) que questionávamos os nossos pais. Então, numa noite, ao pensarmos sobre a vida, percebemos que fomos muitas vezes injustos, super críticos com nossos pais e que eles fizeram o que puderam com os recursos que tinham e percebemos que não somos tão poderosos assim, que as nossas limitações são maiores do que imaginávamos e, o que é pior, os filhos não vêm com manual de instrução e, o que é bom para um, pode ser péssimo para o outro.
Êta aprendizado doido! (ou será doído?).

Os valores estão mudando muito rapidamente e quase tudo fica obsoleto em pouco tempo, inclusive nós...
Inclusive nós?Não dá para conceber um ser humano ser descartável. Envelhecemos, ficamos com rugas, limitações físicas, doenças crônicas, síndrome do “tchau”, um montão de coisas mas..., e a sabedoria dos mais vividos?
As coisas não nos afetam mais com aquela força que mais parece um furacão. Já passamos por tantas coisas que sabemos que “tudo passa”... Não precisamos, e nem adianta, nos desesperarmos, sabemos que sempre há um dia atrás do outro e que uma hora as coisas vão melhorar ou conseguiremos, de alguma forma, vislumbrar uma luz no fim do túnel, uma solução ou uma forma de lidarmos com o problema de uma forma mais adequada e tranqüila...

Envelhecer é uma arte!

Continuando nossa jornada... Aos 50, vemos nossos filhos saindo para viver suas vidas e nós, mais uma vez, temos que nos adequar `a nossa nova realidade. Temos que traçar novos objetivos, novas maneiras de sobrevivermos emocionalmente e de nos relacionarmos conosco, com os filhos, pais e amigos... É uma fase de uma certa solidão, uma solidão introspectiva que nos leva a repensar nossas prioridades, nossos conceitos, nossa vida...

Nesta época, se não estamos sozinhos, temos que recriar nosso relacionamento com o companheiro, para não perdermos a motivação, não cairmos na “mesmice de um relacionamento corriqueiro e incolor”. Se estamos sós, temos que nos adaptar a uma solidão mais palpável. Isto não nos impede, é claro, de procurarmos um novo companheiro ou outros interesses!

Ainda nesta fase de vida, muitas vezes, temos nossos pais para cuidar, o que não deixa de ser uma dádiva de Deus, pois eles continuam nos ensinando e nos acolhendo, dando sempre o seu apoio e incentivo. Ainda apostam em nós!
Chegamos, então, à conclusão que eles, na verdade, conseguiram fazer milagre!!! Como é que conseguiam conciliar o trabalho, a família, os afazeres domésticos, o cuidado diário com os filhos, honrar todos os seus compromissos??? E ao olharmos seus cabelos já embranquecidos, nos perguntamos: -“Será que chegaremos lá? Com esta garra, esta força, esta sabedoria adquirida com o passar dos anos???”

Nossos pais se tornam heróis!!!

Há alguns anos atrás trabalhei em uma casa de repouso onde havia aproximadamente 20 idosos. Na primeira visita fiquei um bocado chocada, pois parecia que os velhinhos estavam “guardados”, esperando o último suspiro. Acaba nos chocando por ser um espelho “do tipo”: "eu sou você amanhã". Após algum tempo percebi quanta riqueza de vida, quantas histórias tão pessoais e ao mesmo tempo tão parecidas. É um verdadeiro prazer conviver com eles: tão frágeis e ao mesmo tempo tão fortes, tão simples e ao mesmo tempo tão profundos... Cada história de vida nos enriquece; cada história de vida é única, comovente, às vezes por sua leveza, às vezes por sua densidade. E eles nos esperam e nos recebem com tanta alegria e carinho; são momentos de calor humano nos dias serenos e sem novidade de suas existências...

Mas não pensem que eu tinha algo contra os “velhinhos” e que depois percebi o “quão sábios” são. Ao contrário!
Minha avó Esther ficou paraplégica após um derrame cerebral na época em que nasci (meus "amáveis" irmãos diziam que foi do susto que ela levou ao me ver!) e eu ajudava a cuidar dela nas férias e, desde que me entendo por gente, já achava que era difícil envelhecer. Ela era muito calma e sempre contava histórias antes de dormirmos. Gostava de ler um livro chamado “Pérolas Esparsas” onde havia histórias de pessoas alcoólatras, ou que eram espancadas pelo pai, ou alguma tragédia deste “tipo”, que, quando conheciam a Jesus, eram transformadas e a vida da família também. Depois pedia para eu ler algum trecho da Bíblia e, quando eu gaguejava ou não conseguia ler alguma palavra (a página estava até gasta de tanto ler acompanhando com o dedo), ela falava o trecho de cor (e então eu pensava: “por que ela me pede para ler se já sabe tudo de cor?”).
Depois era a hora de orar por cada um dos familiares (eram citados nominalmente e, pasmem, eram quase 30!!!). Naquele tempo eu achava uma coisa , no mínimo, enfadonha, mas contribuiu muito na minha formação pessoal. Ficou acamada por mais de 20 anos e nunca a ouvir se lamuriar ou reclamar da sua situação. Ao contrário, sempre tentava nos mostrar algo, algum princípio, ao ouvir nossas histórias do dia a dia. Aprendi a amá-la e a respeitar as pessoas idosas e, desde então, já ver as suas necessidades tanto físicas quanto psicológicas.

Creio que devemos cuidar dos “nossos velhinhos” com muito amor, pois eles se tornam muito frágeis e carentes, necessitando do nosso amparo e proteção.

Quando observo minha mãe, uma octagenária, completamente lúcida, com limitações físicas e sempre se colocando à disposição dos outros para aconselhar, orar pelas pessoas, participar das suas tristezas e alegrias, esperando que os filhos e os netos a visitem, dando um pouco de atenção e aconchego para tornar sua velhice mais tépida, chego à conclusão que a vida é muito fugaz...
Devemos dar mais valor aos nossos relacionamentos, principalmente com nossos familiares e amigos mais chegados.

Apesar de envelhecermos, temos uma missão, uma função em cada fase da nossa vida e, na medida em que o tempo passa, temos mais experiência, mais paciência, mais calma para podermos passar o que pudemos aprender na vida para as outras pessoas. E continuamos a aprender, sempre!
Aí está a emoção de viver!!! A cada dia, um novo desafio, uma experiência nova, algo a aprender, algo a trocar...(Será que estou sendo romântica demais? Creio que não).

Enquanto Deus nos der o fôlego da vida, peçamos a Ele sabedoria para sabermos o que nos cabe fazer a cada dia, em cada fase da nossa vida.

Enfim, há que se envelhecer, porém, sem perder a esperança, jamais!!!

4 comentários:

  1. acho que o segredo de envelhecer bem é viver com otimismo, agradecendo pelas graças alcançadas e não criar expectativas dificeis para o futuro, tipo fazer a lista do que tenho que realizar , porque as vezes a gente acha muito bonito as coisas materiais que os outros conseguiram, mais por trás daquelas lindas fotos de pessoas em ilhas paradisiacas há historias como aquela do marlon brando ou michael jackson , não é ruim ter-se bens materiais, mais para se ser feliz não é essencial.

    sorte com o novo blog, suas cronicas já dão um livro.

    bjs

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  2. *
    saber envelhecer
    é ser sábio !
    ,
    um mar de luz,
    fica,
    ,
    *

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  3. Anjo só:

    Que bom que você veio!!!

    Melhor ainda que tenha gostado!

    No ano que vem, assim que sair a minha tão almejada aposentadoris, vou atrás de alguma editora e pretendo escrever mais...

    E você tem razão, bens materiais ajudam, mas não trazem felicidade e a sabedoria está em sermos felizes e gratos com o que já temos, almejando mais, mas dentro do atingível...

    bjs

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  4. Poetaés:

    Saber envelhecer é ser sábio!!!

    Gostei!

    Um mar de paz para você.

    bjs

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